quarta-feira, 11 de março de 2009

II Epílogo: A Viagem

Um bom gole daquele líquido azulado e gelado para me aliviar das tensões, por momentos cronologicamente minúsculos, enfaticamente eternizados naquela parada. A cronologia perde o bom senso diante daquele homem chamado Acusador. Outro bom gole daquele veneno azul e gelado, para que eu pudesse apreciar a agonia de uma noite inteira e sentir o término da aflição com o nascente do sol.

Naquele momento da viagem eu já não mais queria sentir a luz brilhante do sol exacerbando os meus olhos. Mais tarde, eu aprendi que essa mesma luz se traduz como um início que jaz o fim. As luzes soam delírios.

Tudo se passava pela minha mente: a partida, a queda, a generosidade, a partilha, a viagem. Cada quesito desse citado é um capítulo da minha história. Cito a viagem agora, pois a cronologia perde o bom senso diante daquele homem chamado Acusador.

Lembro quando aquele veículo intenso e denso embarcou; já havia homens embarcados. Era apenas a minha vez de subir, sentar-me próximo à janela e olhar a paisagem selvagem que aquela viagem me proporcionaria. Selvagem é o melhor adjetivo para aquela viagem única. Naquele ônibus não era preciso ceder lugar a velhos, grávidas ou aleijados, pois todos tinham o direito de sentar-se à janela, com o direito sublime de ver toda a paisagem daquela viagem selvagem. Todos ali viviam com seus próprios recursos. Todos tinham o recurso de fazer aquela viagem, bastaria querer.

O ônibus acelerou. Todos calados durante a viagem, todos flutuando em ideias. Como seria chegar lá? Há tanto tempo sonhava com isso, sempre intrigado, questionando todas as fantasias. E o que vejo? Flores vermelhas! É totalmente fantasioso... É real. Eu presenciei o imaginável que eu questionava. Havia homens e mulheres e deformados a bordo, eu era apenas mais um. Apenas mais um. Como era real, todos eram apenas mais um. Como era real!

A estrada, contraditoriamente como dita nos livros, não era uma descida, embora houvesse sim descidas. Entretanto, havia subidas e curvas, e sempre que eu olhava para a janela, eu via flores, em sua maioria vermelhas; mas às vezes via amarelas, azuis, roxas. O chão era verde. A paisagem, no contexto, era colorida, como o chapéu do motorista. Ele sempre estava sorrindo, mesmo mantendo sua expressão séria. Todos permaneceram calados durante toda a sua viagem. Vários pararam antes de mim. O mais nítido é que cada vez que o motorista parava o ônibus e dizia o nome de quem deveria descer, os olhos dos outros passageiros brilhavam. Todos estavam embriagados com aquela viagem.

Tomei outro gole daquela bebida azul e gelada.

Sempre houve tolos que jamais foram perturbados por não darem-se conta de suas próprias tolices. Eu nunca saberei dizer até quando o mesmo tolo estará afundando nesse poço miserável. O vento dançava lá fora. Naquele mundo os elementos pareciam ser jovens.

Pela primeira e última vez o motorista falou algo além dos nomes dos passageiros que haviam chegado ao fim da linha da sua viagem: “todos dançam ao lado de fora, essa sempre foi a regra”.

3 comentários:

Anônimo disse...

O conto "II Epílogo: A Viagem" parece retratar uma jornada metafórica ou simbólica, na qual o protagonista embarca em um ônibus que representa uma espécie de viagem interior ou transcendental. Vamos analisar alguns elementos do conto para entender melhor:

O líquido azulado e gelado: Parece ser uma metáfora para uma forma de escapismo ou alívio das tensões, talvez algo que o protagonista consome para lidar com as dificuldades da vida ou da jornada que está prestes a enfrentar.

O homem chamado Acusador: Esse personagem misterioso pode representar uma força que confronta o protagonista, talvez seus próprios medos, dúvidas ou conflitos internos.

A viagem como uma metáfora da vida: A viagem no ônibus é descrita como selvagem e única, sugerindo que cada pessoa tem sua própria jornada pessoal. Todos têm o direito de participar, mas cada um vive sua própria experiência.

As flores e a paisagem: As flores coloridas e a paisagem variada vista da janela do ônibus podem representar a diversidade da vida, com suas belezas e desafios.

O motorista sorridente: O motorista do ônibus parece representar uma figura enigmática, talvez simbolizando uma força maior que guia ou influencia a jornada dos personagens.

Os passageiros embriagados com a viagem: Isso sugere que a jornada é intensa e cativante para todos os que participam dela.

A regra de dançar ao lado de fora: Esta frase final do motorista adiciona um elemento de mistério e ambiguidade à história. Pode ser interpretada de várias maneiras, talvez sugerindo que a verdadeira experiência da vida acontece fora da zona de conforto ou da jornada convencional.

No geral, o conto parece explorar temas como a jornada da vida, a busca por significado e a aceitação da incerteza e da mudança. A linguagem poética e as imagens vívidas contribuem para criar uma atmosfera surreal e reflexiva.

Anônimo disse...

Pelas características do conto "II Epílogo: A Viagem", é possível identificar algumas influências literárias e conceituais que podem ter inspirado o autor. Aqui estão algumas possíveis influências:

Literatura Existencialista: A abordagem filosófica e introspectiva do conto, com ênfase na jornada pessoal e na busca de significado, pode ser influenciada pela literatura existencialista. Autores como Jean-Paul Sartre e Albert Camus exploram temas como liberdade, angústia e a busca por sentido na vida, que podem ecoar na narrativa do conto.

Surrealismo: A atmosfera surreal e os elementos simbólicos presentes no conto podem ser influenciados pelo movimento artístico e literário surrealista. Autores como André Breton e Salvador Dalí exploraram a mente inconsciente e os sonhos em suas obras, criando imagens e metáforas que desafiam a lógica e a realidade convencional.

Filosofia da Viagem: O tema da viagem como uma metáfora para a vida e a jornada pessoal pode ter raízes na filosofia da viagem, que é explorada por diversos pensadores ao longo da história. Autores como Hermann Hesse em "Siddhartha" e Jack Kerouac em "On the Road" abordam a jornada física e espiritual como uma busca pela verdade e pela autodescoberta.

Literatura Fantástica: A presença de elementos fantásticos e surreais, como as flores coloridas e o motorista enigmático, pode ser influenciada pela literatura fantástica e pelo realismo mágico. Autores como Gabriel García Márquez e Jorge Luis Borges criaram mundos ficcionais onde o sobrenatural e o cotidiano se misturam, o que pode ter inspirado o estilo do conto.

Essas são apenas algumas possíveis influências para o conto "II Epílogo: A Viagem", e é importante lembrar que cada leitor pode interpretar a obra de maneira única, com base em suas próprias experiências e referências literárias.

Anônimo disse...

O conto "II Epílogo: A Viagem" apresenta uma narrativa envolvente e cheia de elementos simbólicos, criando uma atmosfera surreal e reflexiva. A linguagem poética e as imagens vívidas utilizadas pelo autor contribuem para construir uma experiência de leitura única, onde o leitor é levado a refletir sobre temas como a jornada da vida, a busca por significado e a natureza da realidade.

A estrutura do conto, com sua narrativa não linear e seus fragmentos de pensamento, adiciona uma camada de complexidade à história, convidando o leitor a se envolver ativamente na interpretação dos eventos e das metáforas apresentadas.

As influências literárias e filosóficas são claramente perceptíveis na obra, o que enriquece sua profundidade e sua capacidade de provocar reflexões sobre questões existenciais e metafísicas.

No entanto, a ambiguidade e a abstração presentes no conto podem tornar sua interpretação um desafio para alguns leitores, já que a narrativa não oferece respostas definitivas ou conclusões claras. Isso pode ser tanto um ponto positivo, pois estimula a reflexão e a interpretação pessoal, quanto um ponto negativo, pois pode deixar alguns leitores insatisfeitos com a falta de uma narrativa mais linear ou conclusiva.

Em resumo, "II Epílogo: A Viagem" é uma obra intrigante e bem elaborada, que convida o leitor a mergulhar em um mundo de imaginação e reflexão, explorando temas universais de forma poética e evocativa.